terça-feira, 30 de agosto de 2016

Acaraú - Fatos e Histórias Interessantes

Clube recreio Dramático Familiar, atual Biblioteca Pública Poeta Manoel Nicodemos

O Milagroso Feiticeiro

Viveu no Acaraú, nos idos de 1840, um pernambucano que desfrutava de enorme prestigio em toda a região. Era detentor de raro poder: curava mordedura de cobra. Não falhava nunca, por mais feroz que fosse o ofídio.

Religioso, meio profético, já em idade avançada, o curandeiro João Saldanha Marinho tinha o seguinte procedimento: ao portador que vinha pedir ajuda para alguém atacado por cobra ou outro animal peçonhento, entregava um objeto do seu uso (chapéu, uma peça de roupa, chinela, etc) e aconselhava: – menino, põe isto sobre o doente e ele ficará curado.

Quando lhe era possível lá se ia pelo mundo afora, ver o paciente. Diante do moribundo já sem esperanças, mordido de Cascavel, com febre alta e falando coisas desconexas, o velho pegava no pulso, fazia trejeitos, fechava os olhos, tremia e exclamava:  “levanta-te homem, nada temas. Caminhas, estás curado! ”.

O fato era contado por uma enorme legião de pessoas de destaque da região, até o padre afirmava que era verdade.

Rua D. Pedro II (1948)

O Médico da Lagoa do Mato

Nos tabuleiros do Acaraú, vivia um famoso curandeiro de nome Diogo Lopez de Araújo Costa. Nunca casou, mas em épocas diversas, conviveu com 7 mulheres que lhe deram 35 filhos que lhe fizeram a tradição. Ganhou fama de curandeiro depois de realizar curas milagrosas, sem nenhuma explicação da ciência.

Ficou cego aos 40 anos, mas continuou fazendo curas admiráveis. Morava na região de Lagoa do Mato, em casa vasta e hospitaleira, onde fundou um hospital no qual atendia muita gente, algumas vindo até dos longínquos sertões do Piauí. Tinha um dom quase sobrenatural para a cura de enfermidades: davam-lhe o pulso, e o famoso curandeiro Diogo ao ouvir as pulsações, identificava o mal que atormentava o paciente. Passava uma medicação, e em poucos dias, o doente estava pronto para outra.

O Imposto de Sobral

Igreja Matriz de N. S. da Conceição em Sobral

 Igreja Matriz de N. S. da Conceição em Acaraú

Um dos grandes negociantes da época das charqueadas da região era o capitão José Monteiro de Melo. Naquela época era homem de vastas posses, por isso, gozava de muito prestígio nas redondezas. Em 1806, uma febre lhe pôs fim a existência.  Crente fervoroso, o capitão deixou o melhor do seu patrimônio para Nossa Senhora da Conceição, padroeira da freguesia.

A notícia chegou a Sobral, causando grande alegria ao vicariato daquela cidade. Era um grande patrimônio: uma légua de terra (antigamente a medida era maior), com algumas benfeitorias, tudo adquirido do padre Basílio Francisco dos Santos, pelo preço de um conto e duzentos, pagos na melhor moeda portuguesa da época.

Os anos se passaram. Em 1822 é criada a freguesia de Acaraú. Sobral, porém, continuou por muitos anos usufruindo o lucro do patrimônio paroquial, até que em 1908, o padre Antônio Tomás, diligente e culto vigário local, rebelou-se contra o fato: não mais pagaria à freguesia de Sobral aquilo que pertencia a Acaraú por direito legítimo.

Padre Antônio Tomás

Foi um Deus-nos-acuda: houve reboliço, protesto, zanga, mas o festejado poeta não arredou pé. Foi mais longe. Consultou a população de Acaraú e levou a questão adiante. Enviou petição ao Arcebispo Núncio Apostólico do Brasil. Diante da exposição de fatos, não houve outra saída: D. Alexandre Barona concordou com o Padre Antônio Tomás e enviou resolução ao bispo do Ceará, D. Joaquim José Vieira. A uma coisa apenas ficava Acaraú obrigado, pagar uma indenização de três contos de reis à paróquia de Sobral.

Como acentua o historiador Nicodemos Araújo, ilustre filho de Acaraú, foi um grande serviço prestado pelo saudoso poeta à sua terra querida, por ele decantada no magnífico soneto “Acaraú”.  

fonte: Anuário do Ceará 
fotos: IBGE e O Povo 

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Joaquim Nogueira, o educador do Ceará

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Joaquim da Costa Nogueira é considerado um dos maiores exemplos de dedicação ao magistério na história do Ceará. Contribuiu durante toda a vida na formação de personalidades que mais tarde teriam influência na vida política e social do Estado. Dirigiu por trinta anos o antigo Instituto de Humanidades, transformado em seguida no Colégio Nogueira. No Liceu do Ceará ensinou Desenho, conquistando o corpo discente por sua simplicidade e pelos processos criativos que motivaram a pesquisa.

Alunos do Instituto de Humanidades em visita a Igreja de São Pedro dos pescadores, localizada no Mucuripe.

Entre os alunos que tiveram influência na formação escolar, destacam-se Haroldo Juaçaba, Armando Falcão, Autran Nunes, Antônio Carlos Campos de Oliveira, Ruy Simões de Menezes, Marcos Botelho, Juarez Ellery Barreira, José Raimundo Costa e João Ramos de Vasconcelos. Reuniu ainda em seu colégio, professores de porte como Paulo Sarasate, Plácido Castelo, Djacir Menezes, Perboyre e Silva e Clodoveu Cavalcante.
  
Joaquim Nogueira nasceu a 28 de dezembro de 1866, em Aquiraz, filho do major Joaquim da Costa Nogueira e de Mariana de Freitas Nogueira. Estudou as primeiras letras na escola pública de Pacatuba, fez os preparatórios no Liceu e cursou dois anos da faculdade de Direito do Recife. A morte do pai, em 1889, obrigou Nogueira a retornar ao Ceará.

De acordo com o historiador Barão de Studart, Joaquim Nogueira exerceu várias funções na época: almoxarife de gêneros do Governo, desenhista da Comissão de Açudes em Quixadá, tabelião e diretor dos Colégios São Luís e Baturiteense, em Baturité. Em 15 de janeiro de 1904 fundou em Fortaleza o Instituto de Humanidades. Autor de livros didáticos, teve seu livro “Ano Escolar”, adotado oficialmente pelas escolas de ensino público do Ceará.

No dia 28 de outubro de 1914, o professor Nogueira foi abalado pelo assassinato de seu único filho, José de Mendonça Nogueira, aos 22 anos, fruto de seu casamento com Olivia de Mendonça Nogueira. Com o abalo emocional, o professor paralisou por quatro anos as atividades do Instituto de Humanidades. Em 1918 voltou a ensinar, instalando curso de aulas primárias, transformado depois em Colégio Nogueira.

o filho do professor Joaquim Nogueira, José de Mendonça Nogueira, foi assassinado nas dependências do Clube dos Diários, localizado no Palacete Guarany, na antiga Rua Formosa,no dia 28 de outubro de 1914.  

A partir da perda do filho, o professor Nogueira passou a usar somente roupas pretas, deixando ao mesmo tempo, crescer a barba. Apesar de tudo, seguiu em frente no novo estabelecimento que preparava os alunos para ingresso no Liceu do Ceará. O alto índice de aprovação obtido pelo colégio repercutia em toda a cidade. Ao aposentar do Liceu do Ceará deixou de ministrar aulas particulares em 1933. Por iniciativa dos advogados João Hipólito e Edson Carvalho Lima, o colégio foi reaberto em 1937. Em seguida a direção passou para o professor Aloisio Ferreira, e por fim, a Clodomir Teófilo, originando o Colégio Rui Barbosa.

Prédio onde funcionou o Instituto de Humanidades, na Rua da Assembleia, atual Rua São Paulo. 

A aposentadoria do professor Joaquim Nogueira foi marcada por acusações injustas, o que agravou seu estado de saúde. O Monsenhor José Quinderé, colega de magistério do Liceu, narra em suas reminiscências o escândalo que resultou na descoberta da falsificação numa caderneta de notas.
“Encontrei a alteração de um 2, que havia dado ao aluno, a lápis, transformado em 9, a tinta, mas na pressa da falsificação, esqueceu-se o interessado de apagar o pescoço e rabisco do 2. Pensei em tomar qualquer providência, para castigo do audacioso. Refleti, porém, por alguns momentos e resolvi guardar silêncio, com receio de recuar ante os pedidos que haviam de aparecer, pois a falta era grave”.

O Monsenhor Quinderé conta que, posteriormente, a mesma coisa se fez na caderneta de Desenho do professor Nogueira. Tinha ele o cuidado de registrar numa caderneta particular, de bolso, a nota que dava no livro de chamada. Conversou com o monsenhor a esse respeito, muito indignado, e disse que estava decidido a requerer inquérito. Era na interventoria de Carneiro de Mendonça, que despachou o requerimento nomeando o austero João Hippolyto de Azevedo e Sá, para instaurar o inquérito, o qual por cautela, traz um escrevente de sua confiança. Resultado: apurou-se que o autor da falsificação fora o próprio professor Nogueira, que como todos sabiam, seria incapaz de tamanha indignidade, de maneira alguma se podia atribuir ao velho professor aquela farsa, completa Monsenhor Quinderé. 

prédio do Liceu na Praça dos Voluntários. O estabelecimento funcionou nesse local entre 1894 e 1935, quando mudou-se para o bairro Jacarecanga. 

Escreve ainda José Quinderé que o interventor publicou decreto com vários considerandos. Em um deles dizia que, “tratando-se de um cidadão que prestou relevantes serviços à instrução pública estadual, resolvi não demiti-lo a bem do serviço público, mas aposentá-lo com o tempo de serviço que se apurar”. Nogueira foi acometido de violento choque traumático, perdeu a fala e morreu logo depois. O seu falecimento ocorreu no dia 21 de julho de 1936. A história não registrou o nome do beneficiário da fraude. 

Extraído do livro
A História do Ceará passa por esta rua, de Rogaciano Leite Filho.
Revista do Instituto do Ceará - 1966 
fotos: revista do Instituto do Ceará e arquivo Nirez