sábado, 26 de janeiro de 2013

Os Negócios na Capitania do Siará Grande



Em 1799 todo o comércio do Ceará era com as praças da Bahia, de Pernambuco e do Aracati. Os sertanejos vendiam ali os seus rebanhos, e se proviam de tecidos e artigos importados exclusivamente de Portugal. A Vila do Aracati tinha atingido grande prosperidade nos últimos tempos, e serviu de entreposto do comércio de Pernambuco com a bacia do Jaguaribe e regiões limítrofes. Ali se faziam anualmente charqueadas de 20 a 25 mil bois, e se vendiam cerca de 160 contos de tecidos trazidos de Pernambuco. 

 Aracati (foto IBGE)
Era diminuta a cultura de algodão. Só com a grande perda dos gados em 1792, se desenvolveu o cultivo do produto, e três anso depois se exportavam 18 mil arrobas.

Pela lei colonial, não era lícito à capitania ter comércio direto nem mesmo com Portugal. Esse privilégio cabia somente a certas praças. Segundo os recenseamentos conhecidos, em 1765, a população do Ceará era de 34.000 pessoas de desobriga, quer dizer, superior a 50.000 indivíduos. Havia 20 freguesias. 
O cultivo da cana de açúcar estava muito adiantado no Cariri, e contavam-se 952 fazendas de criação. As sucessivas medidas tomadas pelo governo de Lisboa, por solicitação dos jesuítas, puseram termo à captura dos índios, sendo isto parte para a importação dos africanos, depois da expulsão dos holandeses. Os escravos que existiam na província, tinham, pois, origem dupla. 
Datam de Pero Coelho as notícias de grandes períodos de secas no Ceará, estando hoje averiguado que elas constituem fenômeno próprio desta região, e que se repetem formando ciclos de 100 anos. A de 1692 corresponde às de 1792 e 1891; as de 1725, 1745 e 1777 às de 1825, 1845 e 1877. 

 açude seco no interior do Ceará (IBGE)

Destas calamidades ficaram tristes recordações. A estiagem de 1725 foi tão grande que fez secar até as correntes do Cariri; a de 1777, fez perecer sete oitavos do gado existente na capitania. A de 1792, chamada de seca grande, começou em 1791 e só terminou em 1793. Os sertões se despovoaram e dos retirantes que se aglomeraram no Aracati, 600 pereceram. A varíola se associou à fome como noutras épocas, mostrando-se inseparável das secas. Um terço da população sucumbiu ao flagelo.

extraído do livro de João Brígido
Ceará (Homens e Fatos)

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

A revolta Urbana de 1912

Antônio Pinto Nogueira Accioly
 
Em janeiro de 1912, as principais ruas e praças de Fortaleza se transformam em campos de batalha, na maior explosão de revolta que a capital do Ceará já conheceu.  A população depõe o grupo político que dominou o Estado durante vinte anos (1892-1912): a Oligarquia Nogueira Accioly. Chefiado por Antônio Pinto Nogueira Accioly, o grupo político teve em Fortaleza como um dos principais representantes o intendente Guilherme Rocha, que assim como os Accioly, ficou duas décadas no poder.

 Intendente Guilherme Rocha
 
Guilherme Rocha se notabilizou por priorizar o embelezamento da cidade e o enquadramento de sua população a um comportamento pretensamente europeu. É de sua gestão a aprovação pela Câmara Municipal do Código de Posturas para a Cidade de Fortaleza, e com o apoio do governo do Estado, da construção da mais importante obra arquitetônica do Ceará: o Teatro José de Alencar.
Chefe político desde o final da monarquia – quando chegou a ser deputado, senador e vice-presidente da Província – Nogueira Accioly reorganizou seu grupo tão logo foi proclamada a República. Fundou a União Republicana, mais tarde Partido Republicano Federal, em 1890.
O partido elegeu toda a bancada para a Câmara dos Deputados e a Assembleia Legislativa. Accioly comandava uma máquina política que ia da Assembleia Legislativa à maioria dos chefes políticos do interior do Estado, os chamados coronéis. Uma situação que favorecia  práticas de nepotismo, fraudes, corrupção e atos de violência contra os adversários.


A Passeata das Crianças 

O maior deles – a gota d’água para a derrubada de Accioly – aconteceu quando a oposição lançou Franco Rabelo para a disputa do governo do Estado. Diante da ampla aceitação do opositor na cidade, os acciolinos passaram a usar da violência e intimidação. A cavalaria de Accioly investiu contra uma grande caminhada de crianças e adultos em prol de Rabelo. A revolta durou de 21 a 23 de janeiro e só terminou com a deposição do oligarca.

 Avenida Marquês de Herval, destruída na revolta de janeiro de 1912

 Após ser deposto do cargo de presidente da Província, o oligarca Nogueira Accioly ( de roupa escura e cartola) foi levado ao vapor que o levaria ao Rio de Janeiro
 
Armada, a população ocupou vários pontos da cidade, inclusive o Palácio Governamental, onde estava Accioly. Formou barricadas, promoveu saques, e destruiu símbolos do poder de então. Entre os alvos, a Praça Marquês de Herval, remodelada por Guilherme Rocha e a Avenida Nogueira Accioly, instalada em seu interior. 


fotos do Arquivo Nirez
Extraído da Revista Fortaleza, fascículo 4
Artigo A Capital pega em Arma, de Erivaldo Carvalho

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Benigna, (Pode ser) a Primeira Santa do Ceará




Há 70 anos, Benigna Cardoso da Silva, de  13 anos, foi assassinada por um adolescente no Sítio Oitis, no Distrito de Inhumas, município de Santana do Cariri, onde morava. Ele se apaixonou pela menina, que não demonstrou interesse.  
Revoltado com a rejeição,  o garoto desferiu vários golpes de facão e matou a menina franzina, que não teve como se defender diante da fúria do garoto que a perseguia. Benigna tinha ido buscar água na cacimba, como fazia todo fim de tarde. Nas proximidades da casa  abandonada do Sítio Oitis foi colocada uma cruz, no local onde a menina caiu morta, na tarde do dia 24 de outubro de 1941. Foi encontrada pelo irmão Sirineu, que estava nas proximidades, mas não percebeu o acontecimento.

foto Diário do Nordeste

Desde o dia do trágico acontecimento, que os moradores da localidade começaram a alcançar graças e até milagres em nome da jovem martirizada. Tanto que a agora, com apoio da Igreja Católica, existe um movimento em prol da beatificação de Benigna. Ela poderá ser a primeira a ser beatificada no Estado do Ceará.
Benigna ficou órfã de pai e mãe logo cedo. Ela nasceu em 15 de outubro de 1928, na mesma localidade onde morreu.  A menina de estatura média, morena clara, cabelos e olhos castanhos escuros, rosto arredondado e queixo afinado, conforme um dos integrantes da comissão responsável pelos levantamentos históricos tem hoje na sede do santuário apenas um retrato falado. O pote que ela carregava na hora do assassinato está envolto a uma redoma de vidro, com esculturas que retratam o momento em que foi  morta por Raul Alves, de 13 anos, que foi preso e cumpriu pena. Segundo levantamentos realizados por pelas irmãs de Benigna, ela era uma menina de semblante triste, calma, simples e frágil.

foto:http://cariricaturas.blogspot.com.br/2011/09/benigna-santa-de-santana-do-cariri-por.html 
 
No local onde ocorreu o assassinato, foi construído um pequeno Santuário, que desde 2004 atrai  romarias para o local em que Benigna viveu e está sepultada. À Benigna são atribuídas inúmeras graças e até milagres que estão sendo documentados por um monsenhor italiano, designado pelo Bispo Fernando Panico para compor o processo de beatificação. 


 Cidade de Santana do Cariri 
foto: http://geoparkararipe.blogspot.com.br/2009/01/santana-do-cariri.html

O Município de Santana do Cariri, criado em 1885,  está localizado na micorregião do Cariri, mesorregião do Sul Cearense. Com 17.170 habitantes (IBGE Censo 2010),  e 807 km² de área, fica entre os municipios de Araripe, Potengi, Altaneira, Assaré, Nova Olinda, Crato e Bodocó e Exu, em Pernambuco. Possui o título de Capital Cearense da Paleontologia.


fontes:
 Jornal Diário do Nordeste
wikipédia
IBGE

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

As Secas como Fenômeno Sócio-Climático



Devido a sua regularidade, as secas eram de grande importância para a compreensão da história do Ceará, influenciando no dia-a-dia dos habitantes, no movimento das populações e mesmo na produção da cultura local. Assim, a seca não é somente um fenômeno climático, mas também social.  A cada final e início de ano, o cearense busca sinais de como será o período chuvoso – o comportamento de certos animais, de insetos, manchas no sol ou no céu, o os ventos, podem ser indicativos de bom inverno ou de mais um período de estiagem.    
No encontro de amigos nas vilas ou nas reuniões nos alpendres das casas sertanejas, o assunto normalmente vem à tona. Nas orações diárias ou nas missas, o pedido aos Santos era pela graça de se ter água em abundância. 
Quando, porém, acabava o mês de março chegava Abril, sem chuvas, as preocupações começavam: como encarar a escassez de alimentos, a perda de safras,  e a falta de pastos para os rebanhos. Diante das grandes distâncias dos sertões, o calor insuportável, a falta de água e alimentos, a seca poderia ser fatal.  
As irregularidades das chuvas já são registradas nos documentos desde os primeiros momentos da conquista do atual território do Ceará. Em 1608, Pero Coelho retirou-se do Siará Grande em sua frustrada tentativa de conquista da terra, em meio à calamitosa estiagem. Nos primeiros séculos da conquista, há referências a diversos períodos de seca. Em todos eles, normalmente ficavam nos sertões um rastro de morte e fome, pois se arruinava a produção agrícola e pecuarista. Não raro ocorriam surtos de doenças como a varíola, afligindo e dizimando a população.  


O fenômeno da seca atinge a todos, ricos e pobres. A falta de água e comida obrigava os sertanejos a se deslocarem, num estratégia de sobrevivência.  Vilas e fazendas ficavam despovoadas ou precariamente habitadas.
Contudo, a maneira como os grandes fazendeiros e comerciantes experimentavam a seca era distinta da forma sentida por pequenos proprietários, escravos, agregados e outros. Como os grandes latifundiários tinham propriedades em regiões diferentes (serras, vilas, etc) tinham mais opções de deslocamento dos rebanhos e dos familiares, não sofrendo os infortúnios e dependendo menos da ajuda de outros.


Já as camadas mais humildes da população buscavam refúgio onde moravam familiares ou amigos. A presença destes era importantíssima, afinal significava facilidade em obter comida, trabalho, teto, ou apoio para recomeçar a vida e reconstruir suas modestas habitações.
Havia casos de os homens partirem na frente, em busca de uma área propícia, deixando a mulher com os filhos para trás – isso para terem mais facilidades nos deslocamentos, e não submeter a família às dificuldades da viagem – muitos  migrantes morriam durante as longas caminhadas. Ao encontrarem uma região com melhores condições, aqueles homens voltavam para buscar a mulher e os filhos. Existiam ocasiões, contudo, dos homens nunca voltarem , ou quando voltaram, encontraram seus parentes mortos.
As regiões cearenses eram atingidas pela seca de maneira distinta. Vilas mais prósperas, situadas em regiões litorâneas ou áreas serranas, a exemplo de Aracati e Crato, resistiram com menos dificuldades ao flagelo, apesar de terem suas populações aumentadas com a migração dos retirantes.

vídeo: musica Triste Partida, de Patativa do Assaré
voz de Luiz Gonzaga
fotos: Folha.Uol.
fonte:
História do Ceará, de Aírton de Farias